Pensamentos de um Plague Doctor
Olhando nesse lugar de ossos e carne podre, eu sinto a insignificância do ser.
Acabou de chegar mais uma leva deles. É noite de Halloween.
Dizem que fede.
Eu não sinto mais cheiros.
Eu sinto intenções.
Aqui tem de tudo: homem, mulher, criança.
Não há distinção.
Mas quando o sangue pulsava nas veias, existia: quem era melhor que quem, o que fazia, se tinha mais poder que o vizinho.
A criança que apanhava dos pais e que batia em outras crianças na rua. O pai que cresceu acreditando que aquilo era o certo. A mãe que era calada pois não podia ter voz dentro de sua própria casa.
Aqui, não existe absolutamente mais nada disso.
É só resto de gente.
Ossos.
Carne podre.
Dizem que eu sou ruim, mas aí vem a pergunta: eu que sou ruim por levá-los para o outro lado da vida, ou são eles que não deram um pingo de valor no que eles eram e no que se tornaram?
Dizem também que não podem olhar nos meus olhos... O que meus olhos tem de tão perigoso?
Fico aqui a pensar... Não sei por quanto tempo estou aqui.
Já vi reis sentando em seus tronos, e já vi os mesmos vindo parar aqui.
Misturando sua carne e seus ossos com o povo que ele mesmo não fez questão de cuidar.
Já vi gente achando que tinha de tudo e acabou vindo parar no mesmo lugar que o mendigo que ficava na praça, apodrecendo em vida.
Todos vem parar aqui.
E eu continuo por aqui, sem saber até quando, apenas sentindo as suas intenções que em vida eram transformado em certezas.
E eu que sou ruim...
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Pintura por: Lika Terssetti
Ilustração do Adult Coloring Book: “The Beauty of Horror“, de Alan Robert
Editora: IDW Publishing